Direta ou indiretamente influenciadas pela psicanálise, a imensa maioria das pessoas, ao pensar sobre seus problemas, logo acredita que resolver suas questões implica descobrir a raiz, a “causa” onde tudo começou, como se houvesse uma espécie de débito pendente, um elo mal resolvido entre presente e passado. Consoante essa crença, pouco razoável e bastante anticientífica, estimam que o manejo terapêutico tenha como premissa básica a investigação dos verdadeiros fatos, tal como um inquérito policial, para juntar peças de um quebra-cabeça que se espalham como destroços de um desastre à deriva num infindável oceano.
Na terapia, a jornada em direção à cura desvia-se da busca interminável no passado para abordar os padrões atuais de pensamento, revelando que a transformação reside não nas profundezas ocultas, mas na clareza do presente.
Caso fosse verdade, faria todo sentido que a terapia durasse anos e anos, ocorrendo entre chutes, análises, a testagem de infinitas combinações em busca de uma tão sonhada fenda no solo do inconsciente para que dali o analista possa receber o material e buscar os encaixes reconstitutivos… e em meses de buscas de tanta complexidade, observa-se pouca ou nenhuma melhora. Sim, isto faria sentido, mas felizmente tal premissa não é verdadeira. O inconsciente como déspota, algoz e fonte das angústias não é mais o campo onde se presume que floresçam os problemas. Na realidade, está muito bem estabelecido cientificamente que muitos deles são aprendidos como comportamentos mentais, meros jeitos de pensar: o modo como se interpreta uma situação, de como a classifica, faz disparar os mecanismos que causam estados de ansiedade, aflição e angústia acentuados, e o paciente vê-se sufocado em raciocínios inconclusivos e, naturalmente, deprime-se.
A prova de que não há no passado a causa do que se sofre no presente é a facilidade com que um terapeuta cognitivo ou mesmo um hipnólogo conseguem viabilizar comportamentos novos, novas sensações e dessensibilizações em fração de minutos. Não existe em cada ato de pensar um “escaneamento” das imagens passadas para determinar o que se sente no presente. Não há ligação direta com uma “causa” passada. É simplesmente o presente quem define o presente e será possível sentir mil coisas diferentes sobre o mesmo objeto-problema conforme a maneira como se pensa. Só depende do contexto, de quem fala, dos acontecimentos do próprio dia em que se está. A influência do passado está precisamente nos comportamentos mentais aprendidos em épocas passadas, que podem ter sido adotados em um momento de pouca reflexão ou que eram perfeitamente adequados ao seu contexto na ocasião específica, mas o sujeito não percebeu que podia ou devia optar por outro pensamento ou reformá-lo logo depois, em um background diferente. Sendo assim, alguém que na infância não queria apresentar-se na formatura e por nervosismo tenha sofrido um vômito, aprende inconscientemente a provocar vômito nas próximas situações das quais desejaria se livrar e com o passar dos anos esquece-se de “desaprender”, de desabilitar esse dolorido, mas útil recurso. Poderá provocar náuseas de uma maneira incontrolável ao longo da vida simplesmente por não ter reaprendido a não contrair o abdômen – e inclusive pode nem saber que contrai. Só conhece os sintomas, e do resto nada lembra. Tendo aqui uma ação inconsciente e não do inconsciente. Este não é uma força, uma inteligência, um outro eu. Por “inconsciente” simplesmente podemos compreender os processos mentais que executamos e não percebemos; e a maioria dos processos inconscientes, quando se tornam conscientes, através de uma explicação do terapeuta ou de um breve exercício, na maioria das vezes podem ser controladas, inibidas ou potencializadas, conforme o interesse do paciente, o dono desse organismo.
Freud pavimentou o caminho com suas teorias, mas a terapia moderna, ao abraçar abordagens cognitivas e comportamentais, oferece soluções práticas e imediatas, reinventando o processo de cura além das expectativas do passado.
Freud foi um homem de seu tempo. Deixou-se encantar pelo fenômeno de conversão de energia e viu com seus próprios olhos o poder da pressão. Supôs, por analogia, que dentro do homem existem forças que, se forem reprimidas, forçam os alicerces do comportamento e do bem-estar. Desse modo, a análise cuidadosa do terapeuta deveria promover uma espécie de despressurização das forças inconscientes, para que elas sejam liberadas sem prejuízos emocionais ao indivíduo. Está assim estabelecido o modelo hidráulico da emoção. Um terapeuta moderno, não freudiano e que ancora seu trabalho em evidências acadêmicas, entenderá que a proposta de Freud surtirá efeito não pelas razões que o médico austríaco teorizava, mas porque à medida em que o paciente repete inúmeras vezes o seu problema perante o terapeuta, oferece condições de reelaborar suas próprias opiniões. Funciona, mas se a premissa se tornar diretamente cognitiva e comportamental ao invés de “hidráulica”, os resultados já se apresentam na primeiríssima sessão, indo direto ao assunto e permitindo a ambos, terapeuta e cliente, estabelecerem precisamente como desmontar os problemas, como reaprender o correto por cima do desajustado e em quanto tempo se concluirá o tratamento.
Com a abordagem cognitiva, o cliente psicoeducado compreende que o importante é o mal que se sente hoje (o passado já passou e o futuro nem existe), e que pode determinar imediatamente se vai se sentir mal ou bem. O jeito de posicionar o pensamento determinará a reação nervosa, química, que ocorrerá nos recônditos do sistema nervoso. Técnicas como a estimulação recíproca (pensar o problema após uma série de relaxamentos ou ser exposto à questão enquanto recebe estímulos agradáveis por estar fazendo algo prazeroso), a dessensibilização sistemática ou flooding demonstram-se eficazes e velozes em respostas. Por tudo isso, o terapeuta geralmente trata dos problemas em separado. Um de cada vez. E a terapia tende a ser muito breve. Vale a pena considerar que há terapeutas e terapeutas. Existem os cognitivos bons e os nem tão bons. Procure buscar referências junto a parentes e amigos que visitaram um profissional franco, culto, perspicaz e dedicado que mantém seu interesse na recuperação breve e duradoura de seus pacientes, usando das mais modernas e testadas frentes de intervenção.
A psicoterapia, certamente, é um sacerdócio paralelo que devolve vida ao ser vivo. Nunca desista de triturar seus problemas e menos ainda de encontrar um bom profissional. Que Deus dê longa vida a quem trabalha com o que gosta e fornece generosamente os melhores frutos que produz.